13.
Já faz alguns dias que os forasteiros chegaram. Hoje é domingo, dia de missa. Padre Frido está temeroso, e pergunta-se como é que eles chegaram a esse fim de mundo. Isso é que não se sabe, mas com certeza estão no seu encalço, que outro motivo não há para cá estarem, ainda mais esse tal de Christian, ou seja lá como se chama, a quem Frido já conhecia dos tempos de maldade, sendo pouco provável que tenha mudado de profissão e esteja agora metido nesses estudos de atmosfera.
Embora fosse sua vontade, Fritz não poderia deixar de rezar a missa, afinal, a casa estava cheia de fiéis, inclusive os alemães, e ele, enriquecido pela eucaristia e pela palavra de Deus, deveria convocar a todos para a prática da justiça e testemunharem as boas notícias do evangelho. Padre Frido tenta se acalmar, se enriquecer pela eucaristia e pela palavra de Deus, mas acaba se enriquecendo de outras fontes menos sacras e mais profanas, um velho e bom litro de aguardente, donde tira um longo gole e logo em seguida já acha que fez mal, não se arrepende, mas acha que fez mal, pois há muito tempo tinha largado de beber bebidas alcoólicas, com exceção do vinho, que não é bebida alcoólica, mas o sangue de Cristo, e, já que não se sabe ao certo qual era o tipo do sangue de Cristo, todos os vinhos são seu sangue, cada qual um fator, os tintos são RH+, os brancos RH-, os secos o tipo A, os suaves o tipo B, os roses são o tipo O, e a mistura do branco com o tinto é o tipo AB. Sendo assim, se quisermos beber o sangue de Cristo de tipo AB fator RH-, devemos misturar ou o vinho branco seco com o tinto suave, já que o vinho branco seco é o tipo A fator RH- e o tinto suave é o tipo B fator RH+ e sabemos que + com – é igual a -, ou ainda o branco suave, que é tipo B fator RH-, com o tinto seco, que é tipo A fator RH+, e teremos o mesmo tipo AB fator RH-, e assim por diante, ficando livre as combinações de acordo com o espírito e vontades de cada um, sempre de acordo com os princípios sagrados.
A missa já vai começar, Estamos todos aqui reunidos em torno da mesa eucarística como irmãos e irmãs para celebrarmos nossa privilegiada posição de filhos de Deus, que se Deus necessitar de braços para ceifar a messe, daremos os nossos, os dois até, quem puder, que se alguém não puder, capaz de Deus até entender, que somos todos frutos da Sua messe e isso já sabemos, que dirá Deus. Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo, e todos respondem, Amém. Abramos nossos corações ao arrependimento, para sermos menos indignos de nos aproximar da mesa do Senhor. Hoje, irmãos, rezarei uma missa especial de boas vindas aos nossos irmãos alemães. Oremos: Oh Deus, sempre nos preceda e acompanhe a vossa graça para que estejamos sempre atentos ao bem que devemos fazer. Oh Deus, escutai a prece que hoje nossa comunidade leva a Vós. Na confiança de sermos atendidos, pedimos, abençoai estas pessoas que nos visitam, que elas tenham uma boa estadia em nossa vila, e todos respondem Amém. E durante toda a missa padre Frido busca falar palavras de esperança e de arrependimento, de benevolência e de bênção, na tentativa de tocar os duros e frios corações alemães, mas eles parecem nem estarem ouvindo a missa, e certamente não estão, já que não entendem uma só palavra do que padre Frido fala, e mesmo a moça, que entende o português, parece estar com os pensamentos bem longe, ou ao menos, prestando atenção em outra coisa que não a palavra de Deus, pronunciada pela boca já meio espirituosa de Frido, que se mostra cada vez mais perturbado e não consegue deixar de olhar para Christian, que parece já saber de tudo, coisas da cabeça de Frido, que substituiu a água para molhar a garganta pelo vinho do sangue de Cristo, e o vinho do sangue de Cristo pelo aguardente do mijo do Diabo, o que ajuda a sua imaginação a tomar asas, voar para lugares indesejáveis, e acabar encontrando o medo e o desespero, que caminham sempre juntos, pois nunca se ouviu dizer que alguém deu com o medo e não com o desespero, ou vice-versa, que geralmente quando uma coisa vai mal, tudo vai atrás dela, até as que antes iam bem, dando a impressão que as forças do mal são mesmo superiores, o que implica que nossa missão, que é ganhar os céus, não é fácil, e talvez nunca venha a ser, que se perdermos, teremos uma boa desculpa, do tipo Também, quem é que pode com tamanha força. Deus vos abençoe e vos guarde, que Ele vos mostre a Sua face e Se compadeça de vós, volva para vós o Seu olhar e dê a Sua paz. Voltem em paz, irmãos e que Deus vos acompanhem. Dizendo isso, Frido encerra a missa.
O céu já não parecia ser aquele mesmo céu que nos protegia antes da missa. Não estava nublado, ao contrário, estava bem azul, limpo, o sol brilhava, nem quente nem frio, agradável, e nem mesmo as coisas de terra se mostravam diferentes. Salvo variações do tempo, que não há ainda força que o faça parar, os verdes eram os mesmos, as terras eram as mesmas, os animais eram os mesmos, e, embora tudo isso esteja envelhecendo a cada instante, são necessários milhares de pequenos instantes para que possamos notar as diferenças, que cada coisa, viva ou não, só existe enquanto estivermos olhando para ela, que assim que deixarmos de olhar, não estaremos certos de que ainda estarão lá quando olharmos novamente, e mesmo que estivessem, não teríamos a certeza de que a mesma unidade de tempo fora usada para ambos, nós e as coisas, vivas ou não, o que nos remete à incerteza sobre o que acontece conosco quando Deus dá aquela olhadela para as outras coisas que eventualmente necessitem de mais atenção, se o tempo realmente pára para nós ou se ficamos apenas alguns instantes — embora instantes divinos, que devem lá ter outra medida que os nossos instantes terrestres — destituídos das luzes dos olhos do Senhor.
Algo parece não ser o mesmo naquele céu, uma brisa diferente, tão sutil que nenhum ser humano seria capaz de captar, só o olfato de algumas aves, e justo estas não voam agora no céu como de costume, como se soubessem do que está para acontecer, não exatamente o quê ou onde ou como ou com quem, mas sabem. Essa brisa diferente sentem as aves quando Deus, tendo que prestar seus serviços com mais empenho em algum lugar diverso, descuida-se um momento ou outro, e é aí que as coisas acontecem, se bem que, normalmente, ao se dar conta de tudo novamente, pode Ele arrumar as coisas desarrumadas, mas só o faz vez ou outra. Frido acha que quem sofre das gravidades ocorridas é que deveria escolher esses momentos. Talvez esteja certo…
Saindo da missa, Marthe pede a Vicent e Christian para irem na frente, que ela quer dar uma volta pela vila, para tentar se familiarizar mais com os habitantes, e foi aí que João Simão conheceu, enfim, Marthe, quando ia ele num desses seus cantarolares, ela vinha passando, ouviu e achou graça, parou, sorriu para João que já se emendou a puxar conversa e a elogiar a beleza da mulher, e parece que ela gostou, já passou a olhar João mais detalhadamente, o corpo bem torneado, moreno queimado de sol, coisas que não existem lá para os lados dela, e convidou João para ir no seu acampamento esta noite, que não haveria ninguém por lá.
E não foi só João que conheceu sua musa Marthe, mas Pedro também. Parece que Marthe gostou de ser admirada pelos homens de Liúnas, e Pedro, artesão, grande habilidade nas mãos calejadas pelo trabalho, ombros largos e braços fortes, moreno queimado de sol, foi o bastante para que Marthe o convidasse para ir ao seu acampamento esta noite, pois não haveria ninguém por lá.
Dona Marta, dona Marta, ouve-se do lado de dentro do acampamento. Marthe vai atender, Olá, que bom que você veio, entre, sente-se aqui, diz Marthe apontando para um pequeno sofá incrusto na parede do reboque, Aceita uma vodca, Não senhora, muit’obrig… Tome, beba, você vai se sentir melhor. O calor era intenso, e era inevitável o transpirar dos corpos. Marthe passa o copo, que também transpirava devido à vodca gelada, ela se serve de uma também e senta-se ao lado do homem, tão próximo que faz seus seios roçarem no braço dele, que respeitosamente se afasta um pouco, comenta algo sobre um quadro com a figura de um cavalo negro correndo, pendurado na parede, mas Marthe não lhe dá ouvidos e, no instante seguinte, aproxima-se novamente, pergunta se a bebida está boa sem que ao menos ele tivesse provado, enquanto ela já virara o copo e se servira de outra dose, Beba, ele também vira e ela lhe serve mais, E então, como está a bebida, Tá boa sim senhora, e no instante seguinte ela mexe seus longos cabelos loiros e lisos, fazendo-os passar pelo rosto do homem, que já não tem mais espaço na poltrona para ser respeitador, mas ainda arranja um assunto qualquer para falar, os costumes da vila, as pessoas que conhece, os amigos, inimigos que não existem, já que todos são cordiais e de bem, mas ela não ouve e aproxima lentamente os lábios de encontro aos lábios dele, que só não virou o rosto porque aí já seria demais, além de que uma atitude dessas exigiria um outro instante naquilo tudo, e ele queria, ao mesmo tempo, que aquilo tudo acabasse logo e acabasse nunca. Os lábios se uniram, os dela com os dele, e ele já sentia o calor do corpo dela se aproximando do seu, e ela já podia sentir toda aquela corrente de sangue penetrando nas cavernas mais secretas dele, fazendo enrijecer aquele pedaço de músculo que é o sexo, e já ia o dela também se alimentando de um sem número de secreções, preparando-se para o que parecia inevitável, o encontro dos sexos, o dele com o dela, ela buscando com a língua a língua dele, ele se virando como podia, quase que se defendendo de tão fremente desejo, ela, mais experiente com essas coisas momentâneas, num único gesto arrancou a camisa, expondo um par de seios fartos, brancos feito leite, maravilhosos, e depois arrancou a dele, permitindo agora que os corpos ficassem unidos, um sobre o outro, ela por cima, colada no suor de calor e desejo dele. Ela passa a massagear seus ombros, o peito peludo, a barriga, e quando chega lá, começa uma verdadeira luta, aquele zíper, aquele maldito cinto, depois a calça que não saía pelo pé calçado de botas, e ele com as mãos nos seios dela, com a calça nas canelas, ela tira a dela até o joelho, acaricia o membro dele, forçando-o a acariciar o sexo dela, a euforia não permite a lógica e o sincronismo dos movimentos, e eles ganham o chão, ela por cima e ao mesmo tempo por baixo, um rolar desajeitado e majestoso, de desejo, com as calças meio colocadas e meio tiradas, tentaram, mas não conseguiram, e ela geme e grita palavras que ele não entende, ele pergunta se está machucando, ela apenas geme e mexe a cabeça negativamente, arranca as calça de vez e monta, agora sim, doma seu cavalo, que vai a largos e compassados trotes, e acelerando, progressivamente acelerando, cada vez mais, até a cavalgada em desenfreada carreira, buscando a vitória no último páreo, e gritos dela, gemidos meus, palavras indecifráveis, pulos, gritos, gemidos, e eu pude assistir ao orgasmo dela daqui de baixo, lindo, envolvente, como se fosse um arco-íris a refletir cores maravilhosas, e nem assim ela parou, até que chegou o meu momento, a minha vez de perder o domínio da minha razão e entrar nesse arco-íris de luz ofuscante, ah, agora sim, a golfada do prazer supremo da carne, e largamos nossos corpos um sobre o outro, buscando o relaxamento do ato, que por ser o primeiro não foi nada mal. Ela me perguntou se seu corpo estava a pesar sobre o meu, as primeiras palavras depois de cinco minutos de silêncio, eu disse que um pouco só, e então ela se levantou, rompendo a inércia natural e constrangedora, e eu me levantei em seguida, começamos a vestir nossas roupas, ela me ajudou com o cinto, eu a ajudei com a camisa, como se fôssemos velhos parceiros sexuais, eu disse, Já vou indo, e ela, de costas para mim começou a dizer, Tudo bem, e terminou por dizer olhando para mim, com um rosto lindo e satisfeito, não bem para mim, mas para além de mim, com os olhos longe, parecendo atravessar minha alma e ganhar um deserto inteiro por trás, mas rapidamente recompôs o olhar em meus olhos, e apenas, disse, A gente volta a se encontrar, Tudo bem.
E tudo isso aconteceu com João Simão e com Pedro Tristão também, ao mesmo tempo, sem ter o que tirar nem o que pôr, como se fosse possível os dois desfrutarem dos mesmos desejos e dos mesmos prazeres ao mesmo tempo, e um não sabe do outro, mas também não tem muita importância, que embora apaixonados, os dois, são homens de convicta solidão, e não vai ser uma aventura, ainda mais com uma mulher que deve voltar logo para sua terra, que eles vão abrir mão de suas maneiras de viver. Só o que aconteceu de diferente de um para o outro foi quando Marthe perguntou sobre o que faziam, e um respondeu Toco cocho, canto moda, conto casos, não tenho uma ocupação para o sustento, que nem preciso, pois alimento tenho do que planto no meu quintal, e o outro respondeu Faço cochos e móveis, peças de madeira e de cipó, sou artesão, e só. Dito isso, Marthe ficou de aparecer na casa de um para ouvir moda, na de outro para ver artesanatos, embora sabemos que serão outros os motivos das visitas.
E ao se encontrarem Pedro e João, poderiam ter dito Como vai João, Bem, Tá indo para casa, Tô, Se tiver um tempinho para um bate-papo, Agradeço mas deixa para uma outra vez, preciso descansar e pensar numas coisas que me aconteceram, Tá bom, assim eu também faço isso que estou necessitado, Até mais ver, Até. E por ser o mundo redondo e dar voltas, talvez tenha ele dado duas voltas ao mesmo tempo, ou ainda pode ser que tenha passado duas vezes pelo mesmo lugar, só que uma vez com Pedro Tristão e outra com João Simão. Quem aqui vai saber dessas coisas…
Saindo da missa, Marthe pede a Vicent e Christian para irem na frente, que ela quer dar uma volta pela vila, para tentar se familiarizar mais com os habitantes, e foi aí que João Simão conheceu, enfim, Marthe, quando ia ele num desses seus cantarolares, ela vinha passando, ouviu e achou graça, parou, sorriu para João que já se emendou a puxar conversa e a elogiar a beleza da mulher, e parece que ela gostou, já passou a olhar João mais detalhadamente, o corpo bem torneado, moreno queimado de sol, coisas que não existem lá para os lados dela, e convidou João para ir no seu acampamento esta noite, que não haveria ninguém por lá.
E não foi só João que conheceu sua musa Marthe, mas Pedro também. Parece que Marthe gostou de ser admirada pelos homens de Liúnas, e Pedro, artesão, grande habilidade nas mãos calejadas pelo trabalho, ombros largos e braços fortes, moreno queimado de sol, foi o bastante para que Marthe o convidasse para ir ao seu acampamento esta noite, pois não haveria ninguém por lá.
Dona Marta, dona Marta, ouve-se do lado de dentro do acampamento. Marthe vai atender, Olá, que bom que você veio, entre, sente-se aqui, diz Marthe apontando para um pequeno sofá incrusto na parede do reboque, Aceita uma vodca, Não senhora, muit’obrig… Tome, beba, você vai se sentir melhor. O calor era intenso, e era inevitável o transpirar dos corpos. Marthe passa o copo, que também transpirava devido à vodca gelada, ela se serve de uma também e senta-se ao lado do homem, tão próximo que faz seus seios roçarem no braço dele, que respeitosamente se afasta um pouco, comenta algo sobre um quadro com a figura de um cavalo negro correndo, pendurado na parede, mas Marthe não lhe dá ouvidos e, no instante seguinte, aproxima-se novamente, pergunta se a bebida está boa sem que ao menos ele tivesse provado, enquanto ela já virara o copo e se servira de outra dose, Beba, ele também vira e ela lhe serve mais, E então, como está a bebida, Tá boa sim senhora, e no instante seguinte ela mexe seus longos cabelos loiros e lisos, fazendo-os passar pelo rosto do homem, que já não tem mais espaço na poltrona para ser respeitador, mas ainda arranja um assunto qualquer para falar, os costumes da vila, as pessoas que conhece, os amigos, inimigos que não existem, já que todos são cordiais e de bem, mas ela não ouve e aproxima lentamente os lábios de encontro aos lábios dele, que só não virou o rosto porque aí já seria demais, além de que uma atitude dessas exigiria um outro instante naquilo tudo, e ele queria, ao mesmo tempo, que aquilo tudo acabasse logo e acabasse nunca. Os lábios se uniram, os dela com os dele, e ele já sentia o calor do corpo dela se aproximando do seu, e ela já podia sentir toda aquela corrente de sangue penetrando nas cavernas mais secretas dele, fazendo enrijecer aquele pedaço de músculo que é o sexo, e já ia o dela também se alimentando de um sem número de secreções, preparando-se para o que parecia inevitável, o encontro dos sexos, o dele com o dela, ela buscando com a língua a língua dele, ele se virando como podia, quase que se defendendo de tão fremente desejo, ela, mais experiente com essas coisas momentâneas, num único gesto arrancou a camisa, expondo um par de seios fartos, brancos feito leite, maravilhosos, e depois arrancou a dele, permitindo agora que os corpos ficassem unidos, um sobre o outro, ela por cima, colada no suor de calor e desejo dele. Ela passa a massagear seus ombros, o peito peludo, a barriga, e quando chega lá, começa uma verdadeira luta, aquele zíper, aquele maldito cinto, depois a calça que não saía pelo pé calçado de botas, e ele com as mãos nos seios dela, com a calça nas canelas, ela tira a dela até o joelho, acaricia o membro dele, forçando-o a acariciar o sexo dela, a euforia não permite a lógica e o sincronismo dos movimentos, e eles ganham o chão, ela por cima e ao mesmo tempo por baixo, um rolar desajeitado e majestoso, de desejo, com as calças meio colocadas e meio tiradas, tentaram, mas não conseguiram, e ela geme e grita palavras que ele não entende, ele pergunta se está machucando, ela apenas geme e mexe a cabeça negativamente, arranca as calça de vez e monta, agora sim, doma seu cavalo, que vai a largos e compassados trotes, e acelerando, progressivamente acelerando, cada vez mais, até a cavalgada em desenfreada carreira, buscando a vitória no último páreo, e gritos dela, gemidos meus, palavras indecifráveis, pulos, gritos, gemidos, e eu pude assistir ao orgasmo dela daqui de baixo, lindo, envolvente, como se fosse um arco-íris a refletir cores maravilhosas, e nem assim ela parou, até que chegou o meu momento, a minha vez de perder o domínio da minha razão e entrar nesse arco-íris de luz ofuscante, ah, agora sim, a golfada do prazer supremo da carne, e largamos nossos corpos um sobre o outro, buscando o relaxamento do ato, que por ser o primeiro não foi nada mal. Ela me perguntou se seu corpo estava a pesar sobre o meu, as primeiras palavras depois de cinco minutos de silêncio, eu disse que um pouco só, e então ela se levantou, rompendo a inércia natural e constrangedora, e eu me levantei em seguida, começamos a vestir nossas roupas, ela me ajudou com o cinto, eu a ajudei com a camisa, como se fôssemos velhos parceiros sexuais, eu disse, Já vou indo, e ela, de costas para mim começou a dizer, Tudo bem, e terminou por dizer olhando para mim, com um rosto lindo e satisfeito, não bem para mim, mas para além de mim, com os olhos longe, parecendo atravessar minha alma e ganhar um deserto inteiro por trás, mas rapidamente recompôs o olhar em meus olhos, e apenas, disse, A gente volta a se encontrar, Tudo bem.
E tudo isso aconteceu com João Simão e com Pedro Tristão também, ao mesmo tempo, sem ter o que tirar nem o que pôr, como se fosse possível os dois desfrutarem dos mesmos desejos e dos mesmos prazeres ao mesmo tempo, e um não sabe do outro, mas também não tem muita importância, que embora apaixonados, os dois, são homens de convicta solidão, e não vai ser uma aventura, ainda mais com uma mulher que deve voltar logo para sua terra, que eles vão abrir mão de suas maneiras de viver. Só o que aconteceu de diferente de um para o outro foi quando Marthe perguntou sobre o que faziam, e um respondeu Toco cocho, canto moda, conto casos, não tenho uma ocupação para o sustento, que nem preciso, pois alimento tenho do que planto no meu quintal, e o outro respondeu Faço cochos e móveis, peças de madeira e de cipó, sou artesão, e só. Dito isso, Marthe ficou de aparecer na casa de um para ouvir moda, na de outro para ver artesanatos, embora sabemos que serão outros os motivos das visitas.
E ao se encontrarem Pedro e João, poderiam ter dito Como vai João, Bem, Tá indo para casa, Tô, Se tiver um tempinho para um bate-papo, Agradeço mas deixa para uma outra vez, preciso descansar e pensar numas coisas que me aconteceram, Tá bom, assim eu também faço isso que estou necessitado, Até mais ver, Até. E por ser o mundo redondo e dar voltas, talvez tenha ele dado duas voltas ao mesmo tempo, ou ainda pode ser que tenha passado duas vezes pelo mesmo lugar, só que uma vez com Pedro Tristão e outra com João Simão. Quem aqui vai saber dessas coisas…
O céu já não parecia ser aquele mesmo céu que nos protegia antes da missa. Não estava nublado, ao contrário, estava bem azul, limpo, o sol brilhava, nem quente nem frio, agradável, e nem mesmo as coisas de terra se mostravam diferentes. Salvo variações do tempo, que não há ainda força que o faça parar, os verdes eram os mesmos, as terras eram as mesmas, os animais eram os mesmos, e, embora tudo isso esteja envelhecendo a cada instante, são necessários milhares de pequenos instantes para que possamos notar as diferenças, que cada coisa, viva ou não, só existe enquanto estivermos olhando para ela, que assim que deixarmos de olhar, não estaremos certos de que ainda estarão lá quando olharmos novamente, e mesmo que estivessem, não teríamos a certeza de que a mesma unidade de tempo fora usada para ambos, nós e as coisas, vivas ou não, o que nos remete à incerteza sobre o que acontece conosco quando Deus dá aquela olhadela para as outras coisas que eventualmente necessitem de mais atenção, se o tempo realmente pára para nós ou se ficamos apenas alguns instantes — embora instantes divinos, que devem lá ter outra medida que os nossos instantes terrestres — destituídos das luzes dos olhos do Senhor.
Algo parece não ser o mesmo naquele céu, uma brisa diferente, tão sutil que nenhum ser humano seria capaz de captar, só o olfato de algumas aves, e justo estas não voam agora no céu como de costume, como se soubessem do que está para acontecer, não exatamente o quê ou onde ou como ou com quem, mas sabem. Essa brisa diferente sentem as aves quando Deus, tendo que prestar seus serviços com mais empenho em algum lugar diverso, descuida-se um momento ou outro, e é aí que as coisas acontecem, se bem que, normalmente, ao se dar conta de tudo novamente, pode Ele arrumar as coisas desarrumadas, mas só o faz vez ou outra. Frido acha que quem sofre das gravidades ocorridas é que deveria escolher esses momentos. Talvez esteja certo…
Saindo da missa, Marthe pede a Vicent e Christian para irem na frente, que ela quer dar uma volta pela vila, para tentar se familiarizar mais com os habitantes, e foi aí que João Simão conheceu, enfim, Marthe, quando ia ele num desses seus cantarolares, ela vinha passando, ouviu e achou graça, parou, sorriu para João que já se emendou a puxar conversa e a elogiar a beleza da mulher, e parece que ela gostou, já passou a olhar João mais detalhadamente, o corpo bem torneado, moreno queimado de sol, coisas que não existem lá para os lados dela, e convidou João para ir no seu acampamento esta noite, que não haveria ninguém por lá.
E não foi só João que conheceu sua musa Marthe, mas Pedro também. Parece que Marthe gostou de ser admirada pelos homens de Liúnas, e Pedro, artesão, grande habilidade nas mãos calejadas pelo trabalho, ombros largos e braços fortes, moreno queimado de sol, foi o bastante para que Marthe o convidasse para ir ao seu acampamento esta noite, pois não haveria ninguém por lá.
Dona Marta, dona Marta, ouve-se do lado de dentro do acampamento. Marthe vai atender, Olá, que bom que você veio, entre, sente-se aqui, diz Marthe apontando para um pequeno sofá incrusto na parede do reboque, Aceita uma vodca, Não senhora, muit’obrig… Tome, beba, você vai se sentir melhor. O calor era intenso, e era inevitável o transpirar dos corpos. Marthe passa o copo, que também transpirava devido à vodca gelada, ela se serve de uma também e senta-se ao lado do homem, tão próximo que faz seus seios roçarem no braço dele, que respeitosamente se afasta um pouco, comenta algo sobre um quadro com a figura de um cavalo negro correndo, pendurado na parede, mas Marthe não lhe dá ouvidos e, no instante seguinte, aproxima-se novamente, pergunta se a bebida está boa sem que ao menos ele tivesse provado, enquanto ela já virara o copo e se servira de outra dose, Beba, ele também vira e ela lhe serve mais, E então, como está a bebida, Tá boa sim senhora, e no instante seguinte ela mexe seus longos cabelos loiros e lisos, fazendo-os passar pelo rosto do homem, que já não tem mais espaço na poltrona para ser respeitador, mas ainda arranja um assunto qualquer para falar, os costumes da vila, as pessoas que conhece, os amigos, inimigos que não existem, já que todos são cordiais e de bem, mas ela não ouve e aproxima lentamente os lábios de encontro aos lábios dele, que só não virou o rosto porque aí já seria demais, além de que uma atitude dessas exigiria um outro instante naquilo tudo, e ele queria, ao mesmo tempo, que aquilo tudo acabasse logo e acabasse nunca. Os lábios se uniram, os dela com os dele, e ele já sentia o calor do corpo dela se aproximando do seu, e ela já podia sentir toda aquela corrente de sangue penetrando nas cavernas mais secretas dele, fazendo enrijecer aquele pedaço de músculo que é o sexo, e já ia o dela também se alimentando de um sem número de secreções, preparando-se para o que parecia inevitável, o encontro dos sexos, o dele com o dela, ela buscando com a língua a língua dele, ele se virando como podia, quase que se defendendo de tão fremente desejo, ela, mais experiente com essas coisas momentâneas, num único gesto arrancou a camisa, expondo um par de seios fartos, brancos feito leite, maravilhosos, e depois arrancou a dele, permitindo agora que os corpos ficassem unidos, um sobre o outro, ela por cima, colada no suor de calor e desejo dele. Ela passa a massagear seus ombros, o peito peludo, a barriga, e quando chega lá, começa uma verdadeira luta, aquele zíper, aquele maldito cinto, depois a calça que não saía pelo pé calçado de botas, e ele com as mãos nos seios dela, com a calça nas canelas, ela tira a dela até o joelho, acaricia o membro dele, forçando-o a acariciar o sexo dela, a euforia não permite a lógica e o sincronismo dos movimentos, e eles ganham o chão, ela por cima e ao mesmo tempo por baixo, um rolar desajeitado e majestoso, de desejo, com as calças meio colocadas e meio tiradas, tentaram, mas não conseguiram, e ela geme e grita palavras que ele não entende, ele pergunta se está machucando, ela apenas geme e mexe a cabeça negativamente, arranca as calça de vez e monta, agora sim, doma seu cavalo, que vai a largos e compassados trotes, e acelerando, progressivamente acelerando, cada vez mais, até a cavalgada em desenfreada carreira, buscando a vitória no último páreo, e gritos dela, gemidos meus, palavras indecifráveis, pulos, gritos, gemidos, e eu pude assistir ao orgasmo dela daqui de baixo, lindo, envolvente, como se fosse um arco-íris a refletir cores maravilhosas, e nem assim ela parou, até que chegou o meu momento, a minha vez de perder o domínio da minha razão e entrar nesse arco-íris de luz ofuscante, ah, agora sim, a golfada do prazer supremo da carne, e largamos nossos corpos um sobre o outro, buscando o relaxamento do ato, que por ser o primeiro não foi nada mal. Ela me perguntou se seu corpo estava a pesar sobre o meu, as primeiras palavras depois de cinco minutos de silêncio, eu disse que um pouco só, e então ela se levantou, rompendo a inércia natural e constrangedora, e eu me levantei em seguida, começamos a vestir nossas roupas, ela me ajudou com o cinto, eu a ajudei com a camisa, como se fôssemos velhos parceiros sexuais, eu disse, Já vou indo, e ela, de costas para mim começou a dizer, Tudo bem, e terminou por dizer olhando para mim, com um rosto lindo e satisfeito, não bem para mim, mas para além de mim, com os olhos longe, parecendo atravessar minha alma e ganhar um deserto inteiro por trás, mas rapidamente recompôs o olhar em meus olhos, e apenas, disse, A gente volta a se encontrar, Tudo bem.
E tudo isso aconteceu com João Simão e com Pedro Tristão também, ao mesmo tempo, sem ter o que tirar nem o que pôr, como se fosse possível os dois desfrutarem dos mesmos desejos e dos mesmos prazeres ao mesmo tempo, e um não sabe do outro, mas também não tem muita importância, que embora apaixonados, os dois, são homens de convicta solidão, e não vai ser uma aventura, ainda mais com uma mulher que deve voltar logo para sua terra, que eles vão abrir mão de suas maneiras de viver. Só o que aconteceu de diferente de um para o outro foi quando Marthe perguntou sobre o que faziam, e um respondeu Toco cocho, canto moda, conto casos, não tenho uma ocupação para o sustento, que nem preciso, pois alimento tenho do que planto no meu quintal, e o outro respondeu Faço cochos e móveis, peças de madeira e de cipó, sou artesão, e só. Dito isso, Marthe ficou de aparecer na casa de um para ouvir moda, na de outro para ver artesanatos, embora sabemos que serão outros os motivos das visitas.
E ao se encontrarem Pedro e João, poderiam ter dito Como vai João, Bem, Tá indo para casa, Tô, Se tiver um tempinho para um bate-papo, Agradeço mas deixa para uma outra vez, preciso descansar e pensar numas coisas que me aconteceram, Tá bom, assim eu também faço isso que estou necessitado, Até mais ver, Até. E por ser o mundo redondo e dar voltas, talvez tenha ele dado duas voltas ao mesmo tempo, ou ainda pode ser que tenha passado duas vezes pelo mesmo lugar, só que uma vez com Pedro Tristão e outra com João Simão. Quem aqui vai saber dessas coisas…