Quem tocou a campainha. Todo Mundo parecia ansioso quando Alguém abriu a porta:
— Quem está de posse da quantia? Alguém perguntou.
— Por quê Alguém está falando assim? Outrem estranhou.
— Shhh… é português de Portugal, sussurrou Quem.
— Sim, respondeu Quem. E Alguém tem o produto, eu presumo?
Outrem olhava com estranheza para Quem — nunca o vira falar assim, usando o nome do interlocutor como sujeito da oração.
— Ninguém tem, diz Alguém, rapidamente, tentando minimizar o impacto do que dissera.
— Ninguém?
— Sim, Ninguém.
— Mas Ninguém não está no acordo!
— Agora está.
— Eu sei que Agora está no acordo, mas Ninguém? E Desde Quando?
— Desde Quando também. Todo Mundo convidou.
— Todo Mundo… só podia ser! Aposto que Ele também sabia.
— Sim, e… — Alguém titubeou — e Ela também.
— Oh! Exclamou Quem, numa mistura de surpresa e decepção. Ela?
— E Nós!
— Nós?!? Interpelou Outrem. Até Nós?!? E Vocês??? Não me diga que Vocês também?!?
— Não. Vocês não…
— Chega de papo. É o que é, e uma vez que Desde Quando e Agora estejam cientes… Mas ainda precisamos de Ninguém, já que Ninguém tem o produto.
O produto. Não ousavam sequer dizer o nome.
— Quando vai chegar? Perguntou Outrem.
— Que eu saiba Quando não vem, apenas Ninguém — disse Quem.
— Foi o quis dizer: quando Ninguém vai chegar. Retruca Outrem.
— Não, você perguntou de Quando também… Não foi, Alguém?
— Não ouvi nada sobre Também… aliás, há muito tempo não vejo Também, Alguém diz, pensativo.
— Também não — concorda Outrem.
— Com Também Não falei semana passada, lembra Quem…
— E como está ele? Pergunta Outrem.
— Ora… sei lá! Nem conheço Ele pessoalmente, apenas de conversações.
— Não Ele, Também Não.
— Ah, Também Não está bem, com saúde…
— Com Saúde? Exclama Alguém! Não acredito!!! Lembro dele tão bem com Saudades…
— Mas Também Não continua com Saudades… com Saúde e com Saudades, que eu saiba.
— E o que é que Eu tem a ver com tudo isso? Ninguém pergunta, irrompendo pela porta que dava na varanda, surpreendendo Quem e aborrecendo Outrem. Alguém, acostumado com as aparições de Ninguém, manteve-se indiferente.
Ninguém trazia um livro enorme em mãos. O tal produto. Empunhava o livro como se empunhasse uma espada, e pergunta:
— Quem está ciente do poder que este produto pode proporcionar?
— Certamente. Nosso Povo comprometeu-se a usar estas informações com cautela e sabedoria.
— Hum… não confio nele, resmunga Ninguém.
— Não se preocupe, disse Quem em tom tranquilizador. Nosso Povo sabe como lidar com Nele. Está tudo sob controle.
— OK, uma vez que Controle esteja por cima, para mim está bem.
— Para mim também, respondeu OK, desapercebidamente.
Outrem tentava espiar o título do livro de rabo-de-olho. Na capa, duríssima, consegue ler:
Lista de Todos os Nomes Permitidos para Crianças
(e como utilizar corretamente preposições, pronomes, advérbios entre outras classe de palavras)
Outrem reflete: tivéssemos este livro antes, Nosso Povo teria evitado muita confusão!